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D. Afonso Ansemondes (séc. XII)

Rico-Homem da Corte de D. Afonso Henriques. Fundador do Convento dos Cónegos Regrantes de Santa Maria de Refoios de Lima.

A história de um número considerável dos nossos conventos medievais está relacionada, nas suas origens, com a das famílias ilustres que preponderavam na região. Acontece assim com o Convento de Santa Maria de Refoios, cujas paredes ainda hoje se erguem imponentes, repartindo o espaço entre a igreja, convertida em sede de uma extensa paróquia, e o edifício do antigo mosteiro, agora afetado à promissora Escola Superior Agrária de Ponte de Lima, com a ampla quinta que o circunda.

  • Retrato imaginário setecentista de D. Afonso AnsemondesRetrato imaginário setecentista de D. Afonso Ansemondes, que pertenceu ao Convento de Refoios de Lima. Óleo sobre tela (Casa do Baganheiro, Ponte de Lima).

O mais antigo antepassado da família proprietária das terras que viriam a ser doadas ao convento, para viabilizar a sua fundação e subsistência, terá sido um tal Ansemondo, a identificar provavelmente com um presor leonês referido num documento do Mosteiro de Moreira, datado de 914 e mencionado por D. José de Cristo, historiador da Ordem dos Cónegos Regrantes, como referiu Diogo Kopke.

Filho de Ansemondo era Afonso, por isso mesmo designado como Afonso Ansemondes. Compulsando os documentos do antigo Cartulário de Refoios, que erroneamente já foi referido como ‘Cartulário do Mosteiro de Crasto’, encontramos o nome dos seus irmãos: Vilulfo, Tedon e Telo. É este Afonso Ansemondes que em 1154 nos aparece como patriarca da família, na outorga da ‘carta libertatis’ concedida ao mosteiro erigido nas suas terras de Refoios. Neste ato solene, realizado na presença do Legado Papal, o Cardeal Jacinto, que foi o primeiro purpurado romano a visitar Portugal, e ainda na de dois Bispos, de dois Arcediagos e de um certo número de personagens ilustres, acompanham-no os seus filhos Mendo, Afonso e Gelvira, e os sobrinhos Mendo, Diogo e Nuno Guilhufes.

  • Documento de doação da Igreja de Refoios, em 1154, por Afonso Ansemondes
    Documento de doação da Igreja de Refoios, em 1154, por Afonso Ansemondes, seu filho Mendo Afonso e outros membros da família, na presença do Legado Pontifício, Cardeal Jacinto, ao Prior Pedro Peres e demais Religiosos que aí viviam segundo a Regra de Santo Agostinho (ANTT, Coleção Especial, Convento de Refoios de Lima, Maço 1, Doc.1)

Através desse ato solene, Afonso Ansemondes quis certamente homenagear também o seu filho Pedro, que foi importante na diocese de Tui, onde exerceu as funções de Arcediago, e se tornou o primeiro Prior deste convento, mas não teve a satisfação de ver este dia, pois terá morrido pouco tempo antes. Afonso Ansemondes era já um venerando ancião e, ao terminar os seus dias, esperava ser sepultado à sombra do mosteiro, cuja fundação patrocinou com a sua família, o qual se tornaria o maior de sempre em todo o Alto Minho, até ser encerrado, em 1834, em consequência da extinção das ordens religiosas decretada pelo regime liberal.

  • Vista geral do vale de Refoios de Lima
    Vista geral do vale de Refoios de Lima, reconhecendo-se o Convento à esquerda e a Torre à direita.

O continuador de Afonso Ansemondes foi o seu filho Mendo. Mendo Afonso contava-se entre os homens que em 1128 estavam ao lado de D. Afonso Henriques, na luta pelos ideais que iriam conduzir à total independência de Portugal. Agradecido, o futuro Rei doou-lhe um ‘condado’ em Refoios de Lima “pro bono servicio quod mihi facis et facies”.

A partir de 1128, Mendo Afonso acompanharia de perto D. Afonso Henriques, colaborando com ele na atividade bélica e administrativa, centralizada na cidade de Coimbra. Desempenhou as funções de ‘dapífer’ da cúria, procurador e agente de negócios do Rei, entre 1134 e 1154; foi Alcaide do castelo de Arouce, atual Lousã, em 1154, aparecendo como confirmante num bom número de documentos régios. Em Coimbra assistiu ao nascimento da Ordem dos Cónegos Regrantes de Santa Cruz, em 1131, sob o patrocínio de D. Afonso Henriques, e conheceu de perto os fundadores e, entre eles, S. Teotónio, procedente do Minho (Ganfei), e D. João Peculiar, dali a poucos anos eleito Arcebispo de Braga. Em junho de 1150, Mendo Afonso doava a seu irmão Pedro, Prior, e ao respetivo convento, o ‘condado’ de Refoios, com o palácio, as terras e demais bens a ele anexos. A pedido dos mesmos Mendo e Pedro Afonso, D. Afonso Henriques confirmava, em agosto de 1150, a favor da igreja de Santa Maria de Refoios e dos que nela oficiavam, o privilégio de ‘couto’ que a essas terras concedera.

  • No costão da igreja do Convento existe uma lápide que se enquadra na campanha de obras realizadas no séc. XVI
    No costão da igreja do Convento existe uma lápide que se enquadra na campanha de obras realizadas no séc. XVI e que tem a seguinte inscrição: HOC COMITI MENDI REQVIESCVT/ OSSA SEPVLCHRO / QVI TEMPLO HVIC OMNES IPSE DICA / VIT OPES OBIIT ANNO DOMINI / II [·] 2 que se pode traduzir: Neste sepulcro repousam os ossos do Conde Mendo que a este templo dedicou todos os seus recursos. Faleceu no ano do Senhor de 11 . 2

Em 10 de novembro de 1154 assiste-se ao ato solene que coroava todo esse processo, com a outorga da ‘carta libertatis’, verdadeiro auto de fundação oficial do Convento de Santa Maria de Refoios. Os herdeiros da igreja de Santa Maria e dos bens que lhe estavam anexos, Afonso Ansemondes, Mendo e Gelvira Afonso, já sem a presença do irmão Pedro, faziam a doação, sem reservas, de todos os seus direitos, aos frades que aí viviam ou no futuro vivessem na observância da regra de Santo Agostinho.

António Matos Reis